Do ponto de vista de infraestrutura, todos os holofotes da edição 2011 do Mobile World Congress (MWC), que aconteceu em fevereiro em Barcelona, Espanha, estavam voltados para o LTE (Long Term Evolution). Difícil dar dois passos em meio aos oito pavilhões da feira sem esbarrar nessas três letras. Claramente, fornecedores de equipamentos de rede, de terminais e operadoras estão se esforçando para consolidar a tecnologia e promover suas evoluções, como o LTE-Advanced (LTE-A), que em testes durante o MWC chegou a superar 1 Gbps de velocidade no downlink.

O WiMAX, que brigava pelo espaço nos estandes e nas conferências de anos anteriores, sumiu de cena. A exceção ainda é a Intel, que busca dar algum destaque para a tecnologia, além de alguns equipamentos em uma ou outra empresa.

Em termos de tecnologia, foi interessante perceber que, mesmo sem alarde, ou melhor, de forma discreta, todos os fabricantes apresentaram suas evoluções das redes de 3G, o HSPA+, com melhor aproveitamento do espectro disponível e velocidades que podem, inclusive, ultrapassar os atuais 100 Mbps, alcançadas pelas redes LTE já implantadas. Alguns testes com HSPA+ chegaram a 168 Mbps no MWC e há quem prometa 300 Mbps de downlink. Vale lembrar que as versões em operação com HSPA+ vão até 42 Mbps e pelo menos cinco teles móveis se comprometeram a implementar comercialmente versões de 84 Mbps ainda em 2011. A importância dessa evolução é que as operadoras terão oportunidade de otimizar seus investimentos e prolongar a vida útil de suas redes HSPA, em conjunto ou não com redes LTE, e serão capazes de suportar mais tráfego utilizando o espectro existente.

O caminho da América Latina

Tanto a América Latina quanto outros mercados emergentes, que fizeram apenas mais recentemente grandes investimentos para a implementação de suas redes 3G, poderão tirar grande vantagem dessa evolução das redes HSPA.

Vários fatores devem ser levados em consideração na tomada de decisão de implantação da 4G. A primeira delas é que uma rede LTE é uma nova infraestrutura e, ao contrário do HSPA+, não bastam uma atualização simples de software e algumas placas nos atuais equipamentos de rede. Além do mais, LTE também depende de um novo espectro. No Brasil, por exemplo, a Anatel destinou boa parte da faixa de 2,5 GHz para a telefonia móvel, como recomendado pela União Internacional das Telecomunicações (UIT), mas o leilão dessas frequências pode ainda nem ocorrer em 2011. Os fornecedores de equipamentos, entretanto, estão confiantes que ele ocorra a tempo para a implantação de alguns hotspots LTE para a Copa do Mundo de Futebol de 2014. “LTE não otimiza mais espectro do que o HSPA e, dependendo da operadora, se houver espectro suficiente, o upgrade para HSPA+ será mais fácil e menos custoso, por isso algumas teles estão optando por não ir agora para o LTE”, descreve o vice-presidente sênior de marketing, vendas e gerenciamento de produtos da Qualcomm, Luis Piñeda.

Outra barreira ao LTE é que ainda falta escala aos terminais. Na ZTE, por exemplo, o LTE entrou no roadmap de desenvolvimento, com tablets e alguns handsets, “mas não se deve esperar muitos lançamentos até o fim deste ano, não até que os problemas relativos à voz sobre LTE (VoLTE) estejam resolvidos”. reconheceu o vice-presidente executivo da fabricante chinesa, He Shiyou.

Vale lembrar que redes LTE são totalmente IP e, diferentemente das tecnologias tradicionais de telefonia móvel, não há um canal dedicado para voz. Os problemas a que Shiyou se refere dizem respeito à qualidade da VoLTE, que trocando em miúdos é voz sobre IP. Ainda são necessários aperfeiçoamentos para que a VoLTE possa se equiparar à qualidade das chamadas de voz das redes tradicionais.

No começo deste ano, a norte-americana Verizon realizou o primeiro teste de VoLTE em sua rede comercial. O teste é um marco, mas a voz sobre LTE ainda está longe de ser algo consolidado. Uma conversa informal com um engenheiro sênior de design de produto do LTE Innovation Center da Verizon, Alan Sabai, no próprio estande da operadora, deixou isso bem claro. Sabai lembrou que a Verizon, que tinha apenas uma rede CDMA, se viu pressionada pela concorrência das operadoras com redes GSM, com handsets a preços mais atrativos para o usuário final e, assim como aconteceu com a Vivo, teve de fazer uma escolha difícil há alguns anos: migrar sua rede para a tecnologia GSM ou implementar logo uma rede mais avançada, no caso, com LTE. Só que diferentemente da Vivo, a Verizon optou pela segunda possibilidade. “E nosso maior problema agora é que falta escala. O lançamento de redes LTE comerciais é muito recente. Estamos usando nossa rede LTE principalmente, para dados e ainda não sabemos qual será nossa estratégia para voz”, revela. Novamente, de acordo com Sabai, a Verizon tem duas possibilidades: manter o serviço de voz em CDMA, usando assim terminais com chips que integrem as duas redes; ou apostar na VoLTE, ainda incipiente. “Esse teste de VoLTE ainda é só o começo e não podemos arriscar a qualidade do nosso serviço, que tem sido nosso diferencial no mercado. Ao mesmo tempo, ainda não há escala para handsets com esses chipsets que falam com as duas redes. Precisamos de tempo para ver pelo que as demais operadoras que estão implantando LTE optarão e aí sim tomaremos uma decisão”.

Quem paga a rede?

Do lado das operadoras, a principal discussão era sobre o impacto do rápido crescimento do tráfego de dados em suas redes. E as previsões do CEO da Ericsson, Hans Vestberg, só corroboraram o discurso das teles. “A banda larga móvel é o serviço de maior crescimento nas operadoras e a base mundial de acessos móveis deve passar dos atuais 5,3 bilhões para algo entre 7 e 8 bilhões até 2015”, estima. Segundo ele, o número de smartphones em uso deve crescer entre quatro e cinco vezes até 2016 e o tráfego gerado, por sua vez, deve se multiplicar 30 vezes.

Para suportar todo esse tráfego, as teles terão de colocar a mão no bolso e investir pesado nas redes. E não farão isso sem reclamar. Executivos das operadoras que participaram dos principais debates do MWC reconheceram o problema e pediram garantias de retorno sobre o investimento necessário para ampliar a capacidade de transmissão das redes móveis e oferecer maiores velocidades aos clientes.

De acordo com o CEO da Vodafone, Vittorio Colao, o tráfego de dados móveis cresceu 44% em 2010 em relação ao ano anterior na rede da operadora e “é preciso que a regulamentação saia do ‘piloto automático’ e passe a ser mais voltada para uma política industrial”.

Na América Latina, o crescimento médio do tráfego de dados móveis na última década foi de 47% ao ano, segundo estimativas do CEO da América Móvil, Daniel Hajj. “Estamos vivendo agora uma grande expansão do 3G e a América Latina deve chegar a 2014 com 150 milhões de assinantes e uma penetração de 125%”. Atualmente, a região soma mais de 65 milhões de pessoas com dispositivos com acesso a dados, mas Hajj lembra que há ainda 540 milhões de pessoas sem acesso. “Serão mais de 350 milhões de smartphones conectados nos próximos cinco anos e nossos principais desafios serão fazer com que as redes consigam suportar o tráfego e garantir cobertura dos serviços à grande parte da população a preços acessíveis. Não é apenas uma questão técnica, é de modelo de negócio”, pontua.

Segundo o chairman e CEO da Telefônica, César Alierta, entre 2010 e 2014 o total de usuários de banda larga na região deve se expandir em 6,6%; com um crescimento de 31% na banda larga móvel e 11% na fixa. “Até 2014 o tráfego deve crescer seis vezes e, até lá, cerca de 91% desse volume será tráfego de vídeo. Será preciso muito investimento, e quem o fará?”, questiona. Ele citou os aportes necessários em backhaul e backbone: “É preciso lembrar que toda estação radiobase precisa estar conectada a uma rede fixa e a regulação atual não garante o investimento adequado”, criticou. “Precisamos de um novo modelo de negócios para sustentar o investimento necessário e de suporte das agências reguladoras para permitir a recuperação desses valores.”

Também com o discurso alinhado, o chairman e CEO da AT&T, Randall Stephenson, disse que a regulação precisa ser leve. “Estamos falando de investimentos de mais de cinco anos e precisamos de um ambiente regulatório previsível. É isso o que estamos buscando”.

Wi-Fi

Já a China Mobile, para desafogar o tráfego de dados móveis em sua rede, optou pelo Wi-Fi. “Instalaremos cerca de um milhão de hotspots Wi-Fi nos próximos três anos nas áreas de maior concentração de tráfego e faremos do Wi-Fi o acesso primário para dados móveis nessas áreas”, revela o chairman e CEO da operadora, Wang Jianzhou. A China Mobile vive momento de explosão do tráfego de dados, com mais de 600 milhões de assinantes móveis e mais de 8 milhões de smartphones em sua base. “O Wi-Fi é um importante complemento para as redes celulares, tanto que operadoras do Japão e Coreia já estão buscando um acordo para roaming internacional de Wi-Fi”, diz.

Na Europa, DVB-H dá lugar ao IMB

Em meio a demonstrações de novas tecnologias de redes, devices e aplicativos, o MWC trouxe à tona a realidade europeia de um tema já bastante discutido: a TV móvel.

O que conhecíamos como padrão europeu de mobile TV, o DVB-H, aparentemente está com os dias contados. E, mais que isso, já tem um substituto – o Integrated Mobile Broadcast (IMB), baseado nas especificações do release 8 do 3GPP e que permite broadcast de dados sobre a rede 3G usando parte da faixa destinada para TV digital terrestre na Europa. Pelo menos essa é a tecnologia que parece ser a preferida dos operadores de telecomunicações, detentores do espectro.

Nos últimos anos, Alemanha, Holanda, Suíça, França e Áustria lançaram e posteriormente descontinuaram suas operações de DVB-H. “Não há muita opção de handsets com DVB-H embarcado, os que existem são muito caros e poucos usuários assinaram o serviço”, justifica o especialista técnico sênior de redes de acesso de rádio da Orange, Benoît Graves. “Além disso, a transmissão utilizando DVB-H demanda muita banda, e as redes das operadoras não suportariam transmissões simultâneas de canais ao vivo para muitas pessoas”, completa.

No Reino Unido, O2, Vodafone e Orange descartaram a possibilidade de lançar DVB-H e testam em conjunto o IMB com cerca de 200 assinantes. Para isso, usam 5 MHz da Orange UK e 5 MHz da O2, faixas destinadas a serviços de TDD (Time Division Duplex) e que estavam subutilizadas. “A vantagem é que o IMB usa um único canal de frequência para transmissões simultâneas de conteúdo, o que melhora a eficiência de uso do espectro; e está bem integrado às atuais redes 3G”, detalha Graves. Outro ponto relevante é que cerca de 150 operadoras de mais de 60 países da Europa e cobrindo cerca de 500 milhões de usuários receberam faixas para serviços TDD junto com as licenças de 3G e têm os 5 MHz necessários para o IMB.

O headend utilizado no teste é da Ericsson, a conectividade é da British Telecom e o player multimídia é da Streamezzo. A IPWireless fabrica o chipset IMB, já integrado no modelo KS20, da LG, no Galaxy S e Galaxy Tab, da Samsung, e em acessórios para iPhone e iPad. “Nos nossos testes, estamos fazendo broadcast de até 20 canais de TV ao vivo com apenas 300 kbps, dez canais de áudio e ainda um carrossel dos conteúdos mais populares on demand para serem baixados pela rede de dados móveis”, revela Graves.

É claro que o Brasil vive uma situação bem diferente com o padrão brasileiro de TV digital aberta, já que o ISDB-T permite a transmissão gratuita do sinal da TV na faixa de UHF, isto é, diretamente para receptores integrados nos handsets e sem que seja preciso utilizar as redes celulares. Mas, como também temos serviços pagos de TV móvel lançados nas redes das operadoras nacionais, se o IMB ganhar escala na Europa, é bem possível que comecemos a ouvir falar mais dele por aqui.

HSPA: 17 milhões de novas conexões ao mês

Enquanto a massificação de redes LTE ainda está distante, por decisão estratégica das teles ou por falta de espectro, a GSM Association (GSMA) divulgou, no primeiro dia do MWC, números de um estudo encomendado à Wireless Intelligence que mostra que o HSPA é e deve continuar sendo por um bom tempo a principal tecnologia de acesso à banda larga móvel.

Segundo o estudo, já são mais de 400 milhões de conexões HSPA em todo o mundo e aproximadamente 17 milhões de novas conexões ao mês, quase o dobro dos 9 milhões de novas conexões ao mês registrados no ano anterior.

O crescimento, sem dúvida, está sendo impulsionado pela queda dos preços dos aparelhos e o aumento do número de redes HSPA em operação. Segundo a GSMA, há cerca de 2,9 mil devices HSPA de 200 fabricantes e 341 redes HSPA em operação em 132 países.

Já são 76 as redes HSPA+ com capacidade para velocidades de download de até 42 Mbps e outras 52 redes estão em planejamento para lançamento comercial em breve.

A estimativa da associação é a de que nos últimos 12 meses as operadoras tenham investido mais de US$ 72 bilhões em infraestrutura de banda larga móvel e upgrade de redes.

LTE

Os números do LTE, por sua vez, são bem mais modestos, como era de se esperar. A previsão da Wireless Intelligence é a de que até o final de 2011 haja cerca de 4,2 milhões de conexões móveis nas redes LTE espalhadas por 24 países e a expectativa é a de que esse número chegue a 300 milhões de conexões LTE em 55 países até 2015. * Colaborou Fernando Paiva

A aposta no NFC

Este será o ano do NFC (Near Field Communications), tecnologia de comunicação por aproximação entre máquinas, que permite a troca de informações sem a necessidade de acesso à rede de dados da operadora ou à Internet. Pelo menos é o que disseram executivos da Orange, da operadora coreana KT e da RIM durante o Mobile World Congress. Para justificar a empolgação, eles citam os seguintes fatores: 1) Nos EUA, AT&T, T-Mobile e Verizon Wireless criaram ano passado a joint-venture Isis, para construir uma rede comum de NFC; 2) Na Ásia, no mês passado, KT, China Mobile e NTT DoCoMo se aliaram para estabelecer padrões de roaming de serviços NFC; 3) Em poucos meses após seu lançamento, no fim de 2010, o serviço de m-wallet via NFC da KT alcançou 150 mil usuários; 4) Diversos fabricantes lançarão smartphones com NFC este ano e há rumores de que o iPhone 5 seria um deles. As estimativas são de que em 2015 haverá 457 milhões de telefones com a tecnologia NFC no mundo, que irão realizar cerca de 3,5 bilhões de transações.

Logo após o MWC, foi anunciada a aliança entre as principais operadoras de telecomunicações para implementar NFC e lançar serviços comercialmente em mercados selecionados até 2012. A aliança inclui operadoras como América Móvil, Bharti, China Unicom, Deutsche Telekom, KT Corporation, Orange, Qtel Group, SK Telecom, Softbank, Telecom Italia, Telefónica e Vodafone. “O NFC será tão comum em smartphones quanto Wi-Fi, Bluetooth ou GPS”, afirmou o vice-presidente de gerenciamento de produtos de software da RIM, Andrew Bocking. “O NFC não é mais um desses serviços para geeks, que precisam ser explicados para os outros usuários. Ele é realmente simples de entender”, argumenta a vice-presidente de serviços móveis da Orange, Anne Bouverot.

Apesar do entusiasmo dos especialistas, ainda há problemas a serem resolvidos. O modelo de negócios entre teles e instituições financeiras ainda não está claro. Anne, da Orange, aponta dois caminhos que podem coexistir, dependendo do mercado e de suas leis: os pagamentos feitos via NFC seriam descontados na conta telefônica ou as teles proveriam uma rede segura para serviços de pagamento via NFC cobrados nas contas bancárias dos correntistas. Em qualquer um dos casos, a executiva propõe que o controle de identificação do usuário fique dentro do SIMCard e não no hardware do telefone ou em algum aplicativo nele instalado. Isso daria poder às teles, já que elas têm acesso remoto aos SIMCards de seus assinantes.

Custo dos leitores

Outro obstáculo é o custo de implementação de leitores NFC. Quem pagará essa conta? Na Coreia do Sul, os próprios lojistas fizeram o investimento para poder participar do serviço de m-wallet da KT, relata a vice-presidente de estratégia da operadora, Hyunmi Yang. Para Anne, da Orange, o melhor caminho é iniciar a oferta em serviços onde já existam leitores de NFC, como meios de transporte público.

O NFC pode ser usado não apenas para pagamentos, mas para diversos outros fins, como controle de entrada de pessoas. Foi apresentado o exemplo de um hotel em Estocolmo, na Suécia, em que o telefone do hóspede se torna a chave para o seu quarto, via NFC. Transferência de conteúdo peer-to-peer, como cartões pessoais, é outra ideia levantada. E também pode servir para acesso a informações contidas em cartões NFC embutidos em objetos como pôsteres de cinema ou anúncios nas prateleiras de supermercados. (Fernando Paiva)

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